Futebol

#ForaTodoMundo

Desde a criação do Twitter eu notei que existe uma diferença brutal entre poder falar e ter o que falar.  A internet dá voz a todos, especialmente àqueles que não tem absolutamente nada pra dizer e, desesperados diante da primeira chance na vida de parecerem relevantes, começam a gritar sem nem pensar o que está sendo dito.

E que diferença faz? Na terra sem lei onde cada um fala o que quer de quem quiser e onde todo nerd vira macho, porque não dar uma de entendido de determinado assunto? O preferido? Futebol, é claro!

Todo excluído quer ser como a maioria. E pra ser como todos os demais é preciso gostar e entender de futebol.  Assim, na web, criou-se a idéia de que o torcedor apoia e vaia o time por ali. Que no estádio é uma fantasia e de que o que vai aos “tts” do twitter é mais relevante do que aquilo que o torcedor no estádio nota, sente e grita.

Se você ficar na web num dia de jogo, meu caro amigo, notará bem o que quero dizer.  A cada 10 minutos surge uma campanha #Foraalgumacoisa e milhares de cidadãos de pouca personalidade ou de pouca noção do assunto seguem como se estivessem derrubando um político corrupto do governo.

Nos últimos 20 dias eu vi #ForaLuxa, #ForaMano, #ForaFelipão, #ForaAdilson, #ForaAbel, entre outros tantos. E olhando a lista, puxando rapido de cabeça e lembrando que o único momento lúcido do Palmeiras nos últimos 10 anos foi nas mãos do Luxemburgo, demitido pela organizada em campanha virtual de “Fora Luxa”, fica fácil entender que estão dando voz demais pra quem não tem nada pra falar.

Num raciocinio lógico, rápido e bastante simples, se Mano, Luxa e Felipão não servem, chegamos a conclusão natural que os últimos 20 anos não existiram. Que tudo que eles ganharam ou fizeram de bom na carreira foi sorte e quem os verdadeiros entendidos de futebol estavam todos esperando a abertura do twitter pra poder ensiná-los.

Isso na verdade não me preocupa, pois todo profissional acima da média costuma não ouvir ninguém e fazer o que ele tem convicção. Tenho certeza que nenhum destes ouve o que dizem os jornalistas, torcedores ou twitteiros. E por isso estão onde estão.

Me preocupa é o fruto do que estamos plantando.

Se cada vez que meia duzia de babaca fizer algo virtual, ou mesmo num muro da cidade as 4 da manha, for taxado de “a torcida do…”, estamos dando microfone pra gralha.  De 30 milhões, 5 pessoas não representam absolutamente NADA. Mas, na notícia, sai que “a torcida do time X…”.

E no twitter, quando sobe nos tts um #Foraquelquercoisa é a torcida do time x que fez.

E não foi.

Essa onda quase doentia de achar que futebol é uma partida de Fifa soccer onde o técnico erra, acerta e só, onde ele aperta botões e os jogadores jogam bem ou mal, está deturpando a realidade. Técnico dá camisa, escolhe a formação e treina. Quem joga é jogador, e se eles errarem, hoje em dia, o cobrado é só o técnico.

Nós vivemos uma geração onde já não temos “homens” em campo. Reclamamos da falta de personalidade desses mimados jogadores que são incapazes de pedir uma bola quando o time está perdendo. E porque será? Talvez por saberem que, hoje, se eles se omitirem do jogo, cairá o técnico, não eles.

A vaia é tamanha em cima do “jogador de video game” chamado de técnico que se o jogador estiver mal a primeira alternativa é “está escalado errado”.

Tá fácil demais ser jogador, e tende a piorar.

Nego joga quarta e domingo e se diz cansadinho. Se faz isso em 2 semanas seguidos, precisa ser poupado.

Se joga mal, foi o gramado. Se joga bem, foi Deus que ajudou.

O técnico ali parado, olhando aquele bando de alienado correndo atrás de uma bola e send0 blindados por torcida, dirigentes e imprensa.

Sim, pois se eles decidirem não jogar, a culpa é do técnico. Só do técnico.

Note que este exagero vem justamente junto com a internet e o video game. Talvez a soma dos dois: Voz a quem pouco sabe e mania de achar que apertando botões o time joga, torne o julgamento tão pouco inteligente e lúcido.

Se o Mano faz tudo errado, se o Dunga era louco, se o Luxa é decadente, se o Felipão não serve mais, se Abel, A. Lopes e outros campeões são tops, se o Zagallo precisou parar pra ter um aplauso ao invés de uma ironia ou piadinha imbecil, algo deve estar bem errado.

E muito provavelmente, olhando pros gramados e vendo o quanto os jogadores andam mimados, livres de responsabilidades e pouco preocupados, o erro está partindo de quem está dando esta blindagem a eles.

Uma vez o professor Valdir Espinosa, técnico de 8 dos 12 grandes do país, campeão de Libertadores, Mundial e ídolo em 2 dos maiores clubes brasileiros, me disse algo que nunca havia notado.

Economista, quando de folga, encontra os amigos e fala de economia. Vendedor de carros, numa festa, comenta as vendas e o mercado. Jogador de futebol sequer assiste a jogos de futebol.

Um profissional desinteressado, mimado, livre de responsabilidades e cheio de benefícios que não se dá ao trabalho de olhar a sua volta.

São estes caras que estamos ajudando a criar quando colocamos tudo nas costas de juiz, gramado, técnico, calendário ou dirigente.

Nem pra um lado, nem pra outro.

Mas é fato que o tempo não faz que Felipão, Luxa, Mano e tantos outros se tornem ruins. Diz a lenda que o tempo te evolui.

Logo, se a impressão é diferente no futebol, talvez haja algo de errado com o futebol.

Os técnicos valem mais do que os jogadores. Os zagueiros valem tanto quanto os atacantes.

Destruir já é tão belo quanto construir. E em breve, não se assuste, você vai aplaudir uma cobrança de lateral.

Aí sim, enfim, teremos virado perfeitos babacas.

abs,
RicaPerrone 

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