Cuca, um brasileiro
Enquanto todos os olhos se voltavam para o campo, passei parte do jogo notando o que o cercava. Ali estava a figura mais brasileira do futebol.
Cuca, o sujeito sem grandes títulos, aquele que leva a fama de “azarado” por não ter o que merecia através de seu trabalho. O que briga com a tendência da retranca mundial, o que luta por uma filosofia morta e que combate a lógica dos fatos com fé.
Brasileiros tem fé. Se apegam a qualquer coisa e juram, sob qualquer condição, que “a vida vai melhorar”.
Vem uma enchente e leva tudo. E “graças a Deus, estamos vivos”, diz um novo sem teto qualquer.
O brasileiro carrega no peito uma esperança sem fim. Uma vontade de poder ter o reconhecimento proporcional ao seu esforço que raramente acontece. Mas ele não se abala.
Briga com a vida, reclama, mas repete: “Vai melhorar”.
Na santa, no santo, no bispo, no papa, em Deus, no seu filho ou mesmo num orixá qualquer, brasileiros sempre carregam alguém com ele. Aqui, ninguém anda sozinho.
A fé combate a derrota. De alguma forma, alivia. É um jeito de se conformar que “não era pra ser desta vez, mas a minha hora vai chegar”, até que um dia a vida se cansa de ouvir, ou se comove com sua fé, e acaba lhe dando razão.
Cuca foi pra campo hoje ser confirmado como o maior pé frio do mundo. Dirigindo um time que convive ha 40 anos com a fama de “cavalo paraguaio”. E sabendo que a chance de perder era maior do que de reverter, lá estavam os milhares de atleticanos, fazendo o mesmo pedido, cada um para um santo diferente.
Cuca levou fé em sua camisa, no pescoço, talvez também no bolso em outros rituais mais íntimos que a tv não pode flagrar.
Cuca é o favorito da noite a “coitadinho”. Mas tem fé. Como todos nós, espera sua vez. Injustiçado ou não, sortudo ou azarado, se desespera, perde a razão, a noção, o equilibrio, mas jamais a fé.
E como que testando até o limite extremo da razão, ameaça faltar. A bola não entra, o juiz não vê os penaltis, os argentinos catimbam, os atleticanos chutam pro alto, eles erram.
Hoje sim, hoje não. Quando, então, senhor?
Cuca segue de joelhos, como quem cobra pelo milagre jamais prometido, mas indiscutivelmente merecido.
E ele vem. No último instante, na última bola, no limite de sua fé.
Ele dirá que “nunca duvidou”, mas é claro que em algum momento naquele banco de reservas olhou pro alto e pensou: “De novo?”.
Não sou um sujeito de muita fé no acaso, em religião ou em algo não explicável. Sou um torcedor de que pessoas boas tenham coisas boas.
Cuca, no último pênalti, me fez olhar pro alto e pensar: “Tem alguém aí pra conduzir isso?”.
E tinha. “Graças a Deus”.
abs,
RicaPerrone