Honestos
Quando vejo um estádio de futebol com torcida única passo a duvidar do futuro desta paixão. Não entra na minha cabeça sequer clássicos 90/10% , imagine com uma torcida excluída do jogo.
Mas entendo que para um universo paralelo como o do futebol muitas vezes a melhor solução é dizer que não tem solução. E então, correr dela.
Atlético e Cruzeiro fizeram um jogo qualquer. Mas em meio a uma partida comum, um zero a zero quase chato, sem grande valor e no meio de um estadual sucateado pelo tempo, surge um surto de bom senso.
Se a torcida do Galo aplaudisse Tinga, vítima de racismo, seria uma atitude midiática, sairia no Fantástico a noite, mas seria hipócrita. O futebol, hoje, é hipócrita pra sobreviver. E talvez por isso vá morrendo aos poucos.
Quando aquela torcida grita: “Tinga, vai se foder! Mas no racismo, estamos com você!”, os microfones se fecham, já que há um palavrão. Mais do que o palavrão, havia uma verdade impressionante e digna de registro.
Ouviram a parte do racismo, ignoraram a sugestão ao jogador adversário. Mas é exatamente aí que está o grande momento do jogo de ontem. Naquele minuto a torcida do Galo disse, sem perceber, que entende a diferença entre rivais e inimigos.
Que sabe separar, ainda, mesmo que haja uma minoria imbecil, o futebol do mundo real. E que o Tinga não vai ser aplaudido pela torcida do Galo por questão de princípios. Mas que pelos mesmos princípios, não ignorariam um ato racista contra um de seus compatriotas.
Nada do que Tinga ouvisse naquele estádio soaria mais honesto quanto o que fez a torcida do Galo. Nenhum depoimento jornalistico na tv, nenhum simbolo negro comovido, nada foi tão honesto.
E daquele minuto entendemos não apenas que somos contra o racismo. Mas que queremos nosso rival do outro lado do estádio, gritando, se calando, interagindo, sendo meu alvo e tentando me atingir.
Futebol é isso. Exatamente isso que fez a torcida do Galo ontem.
O resto é invenção de quem não sabe nada sobre ele e jura saber mais que todo mundo.
abs,
RicaPerrone