Os melhores 90 minutos de uma vida
Eu não sou Fluminense. Sou paulista, embora Tricolor, não sou Fluminense.
Nunca fui Fluminense. Mas se um dia me dessem um “passe mágico” para ser outro torcedor por 90 minutos, eu escolheria ser Tricolor naquele Maracanã em 1995.
Dizem que nenhum buraquinho do chuveiro falhou naquele domingo. Que todos os carros estavam intactos na saída, que todos encontraram vagas pra estacionar quando chegaram.
Que no café da manhã o pão caiu com a manteiga pra cima. Que esposas não tão amáveis naquele dia acordaram de bom humor.
Não houve transito, não fazia um calor infernal, nem frio. Era 25 de junho de 1995, o dia mais feliz da história de quem faz história.
O Flamengo era campeão de véspera. Porque tinha mais time, porque tinha mais torcida, porque era seu centenário, porque tinha Romário, porque o Fluminense não pagava salários e contava com um time mediano.
Sua torcida sabia disso. As duas sabiam. Foram ao Maracanã buscar coisas diferentes. Uma foi pegar a faixa, a outra foi buscar um milagre.
E com 40 minutos do primeiro tempo, o Fluminense fazia 2×0. Ora, cadê o milagre?
Ele viria. O Flamengo daria as caras do seu jeito. Uma bola, uma explosão, uma torcida inflamada e o empate. Dois gols que dariam o título ao rubro-negro. Nada mais “natural” naquela circunstancia.
Era um roteiro comum. O Flamengo da superação, da massa inflamada virando um jogo, do gol do Romário, o lance espetacular de Fabinho já no fim do jogo. Pronto! 100 anos, campeão no Fla-Flu, indo buscar um jogo perdido. Épico. Tá feito.
E então, já com um a menos pra cada lado, Lira comete a falta mais violenta da história do Maracanã. Mas tem perdão. Porque se o jogador deve jogar pela sua torcida, não havia nada que mais representasse um tricolor naquele momento do que a tentativa de quebrar no meio um flamenguista.
Lira é expulso. Devia ser preso. E a torcida do Fluminense não desiste, mas entende. Era muito mais provável o terceiro do Flamengo do que o gol do Fluminense. Com um a menos, aos 38 do segundo tempo…. Só um milagre.
Opa! Mas não era um milagre que foram buscar?
Como um pai aborrecido com o filho malandro, o Fluminense se posta para um último confronto. Se arma no ataque, avança suas tropas, joga pra direita e vê Aílton, o iluminado, cortar duas bolas improváveis e bater pro gol.
Por pouco, muito pouco, ela não ia entrar. Mas no meio do caminho havia o herói rubro-negro de 1987, o fanfarrão, o falastrão, o craque do time. E de barriga, de onde saem os filhos, tal qual o Flamengo é um pouco do Fluminense, coloca pra dentro e faz o milagre.
Não havia mais som de um lado do Maracanã. As bandeiras rubro-negras foram baixando aos poucos, a torcida do Fluminense não conseguia cantar nada, apenas fazer barulho. Não era organizavel o momento.
Pais e filhos choravam abraçados, amigos, irmãos, desconhecidos íntimos e o sangue nos olhos de quem não queria gritar “Gol”, mas sim todos os palavrões possíveis já inventados até aquele momento.
Era raiva, ódio, paixão. Os sentimentos mais extremos que um ser humano pode sentir. Algo que nunca mais nenhum tricolor que estava naquele Maracanã será submetido novamente. Simplesmente porque não haverá outro Fla-Flu daqueles. Como não há mais aquele Maracanã, nem Renatos, nem Romários, nem 120 mil pessoas por um jogo de futebol.
Há uma história. Belíssima, inacreditável, feliz, trágica, mas a melhor história que o Maracanã já contou.
Hoje faz 20 anos. Desde então o Fluminense caiu pra série B, pra série C. Voltou, foi bicampeão brasileiro, fez história numa Libertadores que era pra ser sua, foi o time mais badalado do país, caiu de novo, se salvou e hoje segue sua rotina de altos e baixos de time grande.
O Flamengo também. Conquistou títulos, viveu crises, não foi rebaixado, é verdade. Mas foi do céu ao inferno algumas vezes.
O Brasil é o país do futebol. O Maracanã é o estádio do Brasil. Fla-Flu fazem o maior jogo do Maracanã.
E se todo tricolor pudesse escolher apenas 90 minutos pra viver, eu não tenho dúvida sobre quais seriam.
abs,
RicaPerrone