Negar os fatos não os altera
Vitória enorme do Fogão ontem e com ela a volta da euforia e confiança. Normal, justo, qualquer um reagiria assim.
Mas negar fatos pra comprar discurso de “contra tudo e todos” usado por 100% dos clubes envolvendo torcedores na narrativa mais fácil e vazia do mundo é um tanto quanto perigoso as vésperas de novos fatos.
Se um raio cair 10 vezes no mesmo lugar é tolo alguém dizer, numa chuva qualquer, que “chupa! Hoje não caiu”.
Nunca ninguém vai achar que todo raio vai cair ali, mas sim que cai mais do que na média. O que é fato. Brigar com fatos costuma dar errado. E os fatos dizem que sim, o Botafogo tem um fantasma histórico em decidir grandes jogos. Qualquer pessoa que tente desmentir isso ou dizer que é criação da imprensa pra perseguir o clube é um tremendo maluco.
Não se briga com fatos. Se trabalha pra mudar os próximos quando eles são desagradáveis. Ignorar os problemas não os resolve. A chuva de revolta contra a verdade absoluta da falta de poder de decisão histórica do Botafogo ontem nas redes sociais é um misto de paixão, overdose pós jogo e burrice.
Respeito as 3. São involuntárias. Mas por não sofrer da última preciso refuta-la.
Sim, o Botafogo perdeu 6 pontos que não deveria ter perdido nas partidas contra Criciuma, Vitoria e Cuiabá em casa. Sim, o Botafogo toma gols no fim que os levam a situações incomuns, mesmo quando consegue vencer. Sim, o Botafogo está há decadas sem ganhar nada e parte disso está na falta de capacidade de decisão.
Todos os fatos citados acima são indiscutíveis. Como bem disse, são fatos e não ideias.
Você pode brigar contra eles, mas nega-los é uma loucura e, pior, um passo para mante-los. Ontem o Fogão conquistou uma vitória grandiosa. A “burrice” entra aí. Na hora que você dobra a aposta e cria um cenário de vida ou morte.
Porque, veja, seria uma pipocada perder pro Inter no Beira Rio ou uma final de Libertadores? Não, nunca. Pro Botafogo, será. Porque? Porque o torcedor vai do inferno de assumir as “pipocadas” num dia pra euforia de peitar o mundo com os “cade a pipoca filhas da puta” do dia seguinte.
Todo botafoguense sabe e convive com o fato do clube ser, historicamente, um perdedor de jogos improváveis. Toda vez que o Botafogo vence um jogo difícil ao invés de seguir o ritmo pra conquista parte da torcida joga um “all in” na base da teoria fácil, pobre e vazia do “contra tudo e todos” e pressiona o próprio time a não repetir a história.
Adivinha quem fica mais vulnerável e pressionado? O proprio Botafogo.
O pessimismo não é menos impactante no clube do que a obrigação de ganhar ou ser um vexame. E toda vez que essa briga vem a tona o botafoguense coloca o clube entre a glória e o vexame, sem a naturalidade da derrota que cabe a todos.
A briga do Botafogo é contra ele mesmo. Toda vez que ele joga essa briga pra fora ele perde porque torna uma decisão num risco de vexame e não de derrota.
Embora não seja o caso, o botafoguense já conseguiu elevar as duas decisões para caso de glória ou vexame tamanha insistência em criar uma narrativa de perseguição global que por obviedade não existe. Ao contrário, existem até rivais torcendo a favor tamanho o periodo sem competitividade.
Se “contra tudo e contra todos” é uma frase feita que os agrada, que tal incluir-se no todos? O Botafogo joga contra um adversário, a história, os rótulos adquiridos por ele mesmo e também contra o céu e inferno que a própria torcida o coloca toda vez que a bola entra.
Se sábado não der certo, embora qualquer análise honesta leve a um resultado normal, será taxado como “pipoca” e “vexame”. E muito disso é sustentado por essa briga burra contra “tudo e todos” quando na verdade o maior adversário do Botafogo sempre foi ele mesmo.
Se os fatos e a história o pressiona, não crie mais um empecilho pra essa decisão. É o melhor Botafogo de décadas. Mas ainda assim é um jogo, tem 11 do outro lado e a bola é teimosa e cheia de vontade própria.
Não haverá “vexame”. É contra o Galo em jogo único e o Inter lá. Pode haver glória, isso sim. O que não faz dos fatos anteriores mentira. Apenas história.
RicaPerrone